Conhecimento é o melhor remédio para combater o subdiagnóstico e o preconceito. Sob esse princípio nasceu o Maio Roxo, campanha dedicada à conscientização e melhoria da qualidade de vida de pacientes com Doenças Inflamatórias Intestinais (DII).
No mundo, já são cerca de 10 milhões de pessoas vivendo com uma DII e esse número disparou na última década aqui no Brasil, como conta o médico Gastroenterologista e Hepatologista e membro da Associação Nacional dos Portadores de Doenças Inflamatórias Intestinais, Guilherme Grossi, com quem conversamos para entender mais sobre e saber como apoiar os indivíduos com DII.
Na conversa, Grossi destacou um ponto importante: as ações de acolhimento e inclusão de pessoas com DII no trabalho. “É necessária compreensão por parte das empresas para que o paciente possa seguir um cronograma adequado de consultas médicas, tenha sempre acesso facilitado aos sanitários e muitas vezes flexibilidade de horários e para agendamento de compromissos”, aconselha. Confira a entrevista completa.
– O que são as DIIs e qual a importância de chamar atenção para esse tema?
As DIIs, representadas principalmente pela retocolite ulcerativa e doença de Crohn, são doenças inflamatórias crônicas do intestino, de origem ainda desconhecida, mas que parecem resultar de alterações na interação da microbiota intestinal, resposta imune e fatores ambientais em indivíduos geneticamente predispostos. Os sintomas incluem diarreia, dor abdominal, perda de peso, presença de sangue nas fezes, fraqueza e urgência evacuatória. São ainda frequentes manifestações extra intestinais, como artralgia, lesões de pele e oculares.
A incidência e a prevalência das DIIs vêm aumentando drasticamente no Brasil na última década. Os recentes avanços terapêuticos tornam cada vez mais importante o diagnóstico correto e precoce da doença. Infelizmente, as DIIs ainda são subdiagnosticadas em nosso país e muitos pacientes não são tratados corretamente.
– Um dos pontos levantados na campanha do Maio Roxo é o impacto que essas doenças podem ter na vida profissional dos pacientes. Quais são os fatores que costumam contribuir para isso e qual o caminho para que pacientes e empresas os superem?
A DII em atividade é associada à redução da qualidade de vida e produtividade no trabalho. Isso está ligado a diversos fatores, como diarreia crônica, dor abdominal, presença de fístulas perianais e retovaginais, manifestações extra intestinais, efeitos adversos de medicamentos e cirurgias. O tratamento adequado pode minimizar os afastamentos do trabalho e aumentar a produtividade do paciente, que quando atinge remissão (controle da doença) pode levar uma vida normal. É necessária compreensão por parte das empresas para que o paciente possa seguir um cronograma adequado de consultas médicas, tenha sempre acesso facilitado aos sanitários e muitas vezes flexibilidade de horários para agendamento de compromissos.
– Quais são as principais dificuldades relatadas por pacientes com DII e como nós, enquanto indivíduos e sociedade, podemos contribuir?
Os pacientes com DII apresentam uma série de dificuldades: atraso no diagnóstico da doença; dificuldade no acesso a medicamentos de alto custo e especialistas; necessidade de adaptação de rotina alimentar; dificuldade de acesso a sanitários; dificuldade de adaptação física e emocional em pacientes ostomizados.
O percurso do paciente com DII até o controle da doença é repleto de curvas e obstáculos. A trajetória se inicia com os primeiros sintomas, seguido de vários meses de visitas a diversos especialistas e salas de emergência, exames invasivos e por imagem. Após o diagnóstico, muitos vivenciam um período de negação e vergonha, ignorando ou menosprezando sintomas. Segue-se então o período de adaptação ao tratamento. É importante destacar que o início do tratamento não significa necessariamente uma melhora imediata, já que essa pode demorar meses – e pode incluir cirurgias, troca de medicações e complicações.
A divulgação da informação na sociedade surge como uma ferramenta para atenuar a árdua jornada do paciente com DII, uma vez que aumenta o conhecimento sobre a doença e contribui para o diagnóstico precoce. Prover conteúdo de qualidade e diminuir a desinformação é vital para que o paciente se sinta seguro sobre sua doença. As associações de pacientes, como a DII Brasil, são também fundamentais, uma vez que geram um sentimento de pertencimento, onde os pacientes se sentem acolhidos e podem trocar experiências e informações. Além disso, promovem uma incessante luta para dar aos pacientes o direito de serem tratados com todos os recursos disponíveis no mundo e melhorar sua qualidade de vida.
– A pandemia afetou os pacientes de DII? Como?
A pandemia de Covid-19 afetou todo o planeta. Os pacientes com DII, devido ao uso frequente de imunossupressores e biológicos, foram especialmente afetados, uma vez que havia um temor de maior risco para infecção grave pelo SARS-CoV-2. Com isso, muitas pessoas deixaram de procurar atendimento médico periódico e realizar seus exames, prejudicando o controle da doença intestinal.
É importante salientar, que mesmo diante da pandemia de Covid-19, os pacientes com DII devem manter acompanhamento regular junto ao médico especialista, uma vez que essas doenças se caracterizam por períodos de remissão e crises. Além disso, medicamentos de alto custo garantidos por meio de políticas públicas, tais como os protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas do Ministério da Saúde, têm sofrido constantes irregularidades no abastecimento da rede SUS.
Guilherme Grossi é Médico Gastroenterologista e Hepatologista, mestre e doutorando em Saúde do Adulto com Ênfase em Gastroenterologia pela UFMG. Atua como Chefe do Serviço de Gastroenterologia e Hepatologia do Hospital da Polícia Militar de Minas Gerais e preceptor da residência de Gastroenterologia do Hospital das Clínicas da UFMG. Também é membro da DII Brasil e GEDIIB.
Gostou deste artigo? Siga a gente no Instagram, Facebook e LinkedIn e acompanhe as nossas novidades.
E-BOOK: baixe aqui o livrinho Reabilitação nas Sequelas Pós-Covid-19.